Nos últimos dois anos, após encerrar o ciclo de seu quinto álbum, A Bolha, Vitor Kley reservou um tempo para tomar fôlego, pois estava prestes a dar o mergulho mais profundo em sua já bem-sucedida carreira. A coragem de encerrar ciclos e desviar de caminhos de sucesso garantido, por onde ele trafegou nos oito anos anteriores, presenteia o público com sua obra mais rica, As Pequenas Grandes Coisas.
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O sexto disco do cantor, que debutou aos 14 anos em 2009, foi arquitetado entre São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Portugal. Pela primeira vez, Vitor assina também a produção musical, trabalhando ao lado de Paul Ralphes, Giba Moojen, Marcelo Camelo e Felipe Vassão, com liberdade criativa para arranjarem as 11 canções com o que cada uma pedia de melhor. A unidade é costurada pela voz e violão inconfundíveis do artista. A temática de amor permanece, mas agora ganha reforço filosófico e existencial.
As Pequenas Grandes Coisas é tudo menos a permanência em bolha de segurança. Também não é um rompimento com a bolha. Vitor simplesmente leva para viajar por outras paradas, para outros destinos e gêneros a mensagem solar melódica que é sua marca.
De cara, em “Que Seja de Alegria”, embarcamos no violão característico de Vitor e ele desvia o voo para uma fusão entre MPB e funk-RnB-soul com batida quebrada que daria orgulho de Jorge Ben a Tim Maia. Nem bem pousamos da magia inicial e somos levados a uma Bossa Bolero Beat na combinação de percussão, voz e violão de “Carta Marcada”, que flutua entre a nova e tradicional MPB.
“Uma Porrada de Problema” tem a marca da trajetória do cantor em balada para se cantar junto, e então deságua uma métrica quase balada suingada reggae em “Quando é Para Ser”.
O miolo do álbum reserva outra balada típica de Vitor em “Vai Ficar Bem” e, em um pop rock dançante oitentista com “De Novo”, até que o artista se une a um ícone da geração anterior à dele, Marcelo Camelo (que também foi um dos produtores), no amor ao samba em “Tudo de Bom (Ô Moça)”.
“A Gente Pode Sair Dessa” abre com um violão como se timbrada para o hitmaker Lulu Santos e, no restante da canção, a referência o encheria de orgulho. “Segredos” é composição antiga de Vitor – data de 2016, anterior até ao sucesso que alcançou com “O Sol” –, e é da mesma safra, na levada de MPB com pop e rock, mas dessa vez com uma referência herdada pelos pais, Fleetwood Mac.
A reta final guarda o momento mais catártico, profundo e emocionante de As Pequenas Grandes Coisas. Em “Vai Por Mim”, uma grande homenagem ao seu pai, ele convida o filósofo Clóvis de Barros Filho para dividir o vocal. “Nossa vida vale pela capacidade de amar e pela sorte de ser amado. A alegria indica a direção da vida”, declama o convidado, em canção que abre na bossa e termina em quase rock.
“Arco-Íris” fecha o trabalho com influência de blues e a mensagem de que o fenômeno óptico de cores acaba no fundo do mar, e que só aqueles que se dispõem aos mergulhos profundos chegam ao pote de ouro, que é a descoberta do sentido da vida. E não é segredo para ninguém de que a matéria-prima deste tesouro são as pequenas grandes coisas.
Ouça:
Confira a entrevista com Vitor Kley:
O que te motivou a dar esse “mergulho profundo” na carreira e buscar novos caminhos musicais nesse álbum?
Eu tinha essa vontade há muito tempo de experimentar coisas novas — explorar novos horizontes, trabalhar com outros produtores e conhecer lugares diferentes para criar. O conceito de As Pequenas Grandes Coisas levou tempo para amadurecer, e esse processo me deu coragem para ir além da música em si: construir novas pontes, fazer conexões e, finalmente, poder compartilhar essa experiência com quem gosta de mim.
Como foi assumir pela primeira vez a produção musical do disco e trabalhar ao lado de nomes como Marcelo Camelo e Paul Ralphs?
Foi incrível e libertador. Paul Ralphs e meu irmão me incentivaram, dizendo que a essência e a alma das minhas músicas já estavam ali. Eu já havia assinado produções de outros artistas, mas nunca das minhas próprias canções — então parei de me auto-sabotar, assinei a produção e senti como se estivesse voando num céu azul. Quanto ao Marcelo Camelo, ele foi um presente: sua sensibilidade somou musicalmente, profissionalmente e pessoalmente, especialmente durante as gravações em Portugal.
Você sente que “As Pequenas Grandes Coisas” é o seu trabalho mais pessoal até agora? Por quê?
Sim. Conforme envelhecemos, ficamos mais profundos, e este álbum reflete isso. Ele percorre as profundezas dos meus amores, desamores, minha vida familiar e meus questionamentos existenciais. Li muito filosofia durante o processo e quis transmitir essas reflexões. O próprio título é um manifesto sobre valorizar pequenos gestos que, somados, fazem algo grande.
A faixa “Vai Por Mim” traz uma homenagem muito emocionante ao seu pai. Como surgiu essa ideia e o convite ao Clóvis de Barros Filho?
A música nasceu em 2018, abordando a experiência de vivenciar a depressão na família. Logo na pré-produção, inseri uma fala do professor Clóvis de Barros Filho sobre “o que é a vida” — e não conseguia imaginar a faixa sem essa participação. Convidei o Clóvis para regravarmos juntos, adicionando um desfecho de esperança: “vamos vencer”. Hoje vejo como a energia do meu pai deu ainda mais força à canção.
Qual foi o maior desafio criativo durante a produção do álbum?
Alinhar a logística e manter um fio condutor sonoro em tantos estúdios e com vários produtores: gravamos em Portugal, Rio, São Paulo e Santa Catarina. Paul Ralphs propôs usar sempre o mesmo microfone vintage (U67) para voz e violão, garantindo que meu DNA artístico estivesse presente, mesmo com arranjos e timbres diversos.
A presença de influências tão diversas — de Jorge Ben a Fleetwood Mac — foi algo planejado ou surgiu naturalmente?
Surgiu naturalmente. Eu ouvia muito Jorge Ben e Fleetwood Mac durante o período de composição, e, por sugestão de Paul Ralphs, passei a escutar Warren Druggs. Essas influências estavam no meu dia a dia e se refletiram sem que eu precisasse pensar explicitamente nelas na hora de compor.
O que o público pode esperar de diferente nos shows dessa nova fase?
Um espetáculo renovado em cores (agora tons de azul, seguindo o arco-íris), mas mantendo nossa essência. Haverá sequências inéditas — como um momento bolero/bossa nova — além de um setlist que mescla o repertório antigo e as novas canções. A turnê passa por Guarapari, Niterói, depois Portugal (dias 5, 6 e 10 de maio) e retorna ao Brasil para o The Best of Blues and Rock com Dave Matthews Band em São Paulo, além de shows de verão na Europa.
Na sua visão, quais são as “pequenas grandes coisas” que mais importam na sua vida hoje?
Acordar e me dar conta de como é maravilhoso estar vivo: ouvir os pássaros, tomar café, pisar na grama descalço. Mas, acima de tudo, valorizar os pequenos gestos de humanidade — um “bom dia”, um “como vai?”, olhar no olho e agradecer. Esses gestos simples, quando somados, tornam o mundo um lugar melhor.
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