Opinião

Um papo sobre RuPaul Charles

RuPaul Charles. Foto: Reprodução/Instagram (@rupaulofficial)

Ela dispensa apresentações. Uma das personalidades mais bem-sucedidas do show business mundial, RuPaul Charles é uma lenda. Seja por sua militância ou por sua presença nada básica, o comunicador vêm, ao longo das décadas, desmistificando muitos pensamentos em relação à classe LGBT, principalmente quando se trata do mundo das drag queens. Líder absoluto no ramo, o artista tem alguns feitos nas costas, sendo consagrado com diversos prêmios, dentre eles o Emmy na categoria “Outstanding Host for a Reality or Reality-Competition Program” por dois anos consecutivos, em 2016 e 2017.

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Criadora de um nome memorável é dono de estilo incrível, o norte-americano rompeu barreiras até antes intocadas, ao mostrar a realidade das drag queens e criando uma competição estilo reality show em que as divas concorressem a um prêmio de US$ 100 mil, além de uma coroa incrível e o título de “melhor drag da América”. Um sonho, não é? Mas nem tudo são flores. As recentes atitudes de RuPaul vem deixando os fãs do programa e os entusiastas da arte um tanto quanto transtornados e é exatamente sobre isso que falaremos a seguir.

Para quem nunca viu “RuPauls Drag Race”, produzido pela Logo TV exibido, atualmente, na VH1 norte-americana – no Brasil, os direitos de exibição são do Multishow, que exibiu apenas a sétima temporada da atração -, é uma competição ao estilo de “America’s Next Super Model”, onde drag queens competem à um prêmio. A cada semana, um mini-desafio e um grande desafio são criados para que as participantes mostrem suas criações, acompanhadas de um desfile com um tema proposto inicialmente. A melhor em cada semana recebe um pequeno mimo, que curtia entre viagens, spas de grátis, roupas, perucas, acessórios e etc. Todavia, as duas piores são postas frente à frente para “dublarem por suas vidas”. A pior tem sua temporada no programa encurtada. Ok, nada demais.

RuPaul Charles. Foto: Reprodução/Instagram (@rupaulofficial)

A 10ª temporada chegou coroando uma década de sucesso, mas até aí, no formato, nada de novo. Os fãs do programa estão mais que acostumados a RuPaul decidir semanalmente quem sai e quem fica na competição, baseado em quê ninguém sabe. Eu, particularmente, concordo com a maioria das decisões da personalidade, então é algo que não me incomoda. Mas será que RuPaul escuta os fãs?

Durante alguns episódios da atual temporada, a drag queen vem recebendo um bombardeio de críticas, uma vez que vemos suas atitudes serem muito grossas com as participantes, mas me chocou – e muito – sua exaltação no episódio “The Reunion”, que foi ao ar na quinta-feira, 21, nos EUA. Após uma das participantes, The Vixen, mencionar sobre tratos que as competidoras negras vem tendo no show, o apresentador deu um show falando que não há nada de errado e que ninguém poderia reclamar. Uma atitude claramente soberba, que para bom entendedor diz “bitch, não tá satisfeita, vai embora”. E ela foi! Simplesmente agradeceu aos fãs e SA-I-U do teatro, localizado em Los Angeles, local que abrigará a final. Quando confrontada por Asia O’Hara, uma das quatro finalistas da temporada, RuPaul foi mais além, deixando claro que se rendeu ao show bis.

Asia O’Hara. Foto: Reprodução/Instagram (@asiaoharaland)

Se em um momento a estrela foi um mártir à luta e direito dos LGBTs, o sucesso subiu à cabeça. Dinheiro e status falam mais que mil atitudes e, se você não quiser fazer parte disso, tem outras mil drags que querem. Algumas ex-participantes de edições anteriores do programa vem relatando alguns detalhes sórdidos da convivência com RuPaul, que trata todos como uma “família”, como se importasse com o bem-estar de cada uma delas. Ao menos, não é o que as queens relatam. Abusos, obrigações e uma penca de situações vem caindo na boca do povo.

Em uma carta aberta, Tyra Sanchez, campeã da segunda temporada do programa, falou sobre a posição de RuPaul em relação à The Vixen e sua posição corroborando com o racismo, gordofobia e diversas situações que vem gerando cyberbullying, e que a estrela faz questão de negligenciar.

The Vixen. Foto: Reprodução/Instagram (@thevixensworld)

“Tentei ignorar seus comentários de ontem à noite esperando que eles desaparecessem no dia seguinte. Aqui estamos nós no dia seguinte e adivinha só: seus comentários ainda estão na minha mente.

“Você disse ‘pessoas brancas me julgam por ser negro, pessoas negras me julgam por ser gay, pessoas gay me jugam por ser muito feminino”. Entretanto, você não mencionou o que Vixen estava se referindo ou falando: PESSOAS GAY TE JULGANDO POR SER NEGRO.

Nem todo mundo é como você Ru. Nós podemos simplesmente ignorar problemas e esperar que eles desapareçam. Já imaginou se Martin Luther King ignorasse os sonhos dele? E se Marsha P. Johnson ignorasse a polícia e nunca começasse aquele tumulto? A nossa bunda gay nunca teria o momento do Orgulho ou a igualdade que nós temos tanto lutado para conseguir. Então falar para alguém ignorar alguma coisa que pode arruinar totalmente sua reputação é simplesmente estúpido. Sabe de uma coisa? Uma vez você me disse para ignorar uma coisa e eu diz. Que burrice a minha…” – Tyra Sanchez.

Bob The Drag Queen foi outra que expôs essa situação, mas que também não gerou nenhuma ação direta da líder do programa. A própria Asia O’Hara assumiu que quase foi morta por vizinhos que não aceitavam seu jeito de “extravagância e vibração”.

Bob The Drag Queen. Foto: Reprodução/Instagram (@bobthedragqueen)

Pode não parecer, mas RuPaul parou no tempo. Num tempo onde as mídias sociais não existiam e a única voz era a dos críticos de TV. Como líder suprema das drags em todo o planeta – e eu mesmo comecei a ver a arte com outros olhos desde que conheci o programa, na quarta temporada -, a artista precisa repensar e ver que não é dona da porra toda como está imaginando. Autocrítica é uma atitude a ser praticada a fim de se tornar uma pessoa melhor. Ninguém tem caráter irrefutável até que se prove. E ninguém é dono da verdade. Os fãs do programa e toda a comunidade precisam disso, da mesma forma que RuPaul precisa de um choque de realidade para entender todas essas nuances e, efetivamente, cuidar de suas queens.

Byiiiiiiing!

 

 

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