Música
Femark reúne cinco compositoras em single que bate de frente com o machismo na música
No universo da música, onde a arte deveria ser sinônimo de liberdade, dados alarmantes revelam uma realidade cruel: mulheres enfrentam barreiras imensas de machismo, tanto nos palcos quanto nos bastidores. Foi como uma forma de posicionar-se contra este cenário que Femark reuniu cinco compositoras da geração emergente da nova MPB para uma imersão sobre temas como feminino, ancestralidade, empoderamento e libertação. As cantoras e compositoras têm origem em três estados brasileiros (São Paulo, Bahia e Rio de Janeiro), diferentes raças, condições sociais e orientações sexuais. Desse camp de composição nasceram seis músicas – entre elas “Passarinha”, que chega às plataformas digitais nesta sexta-feira (25).
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“O conceito do projeto nasce do desejo de revisitar nossas ancestralidades femininas para melhor nos compreendermos no presente e, assim, podermos caminhar para o futuro com intencionalidade. Um verdadeiro exercício de libertação”, explica Femark, que dedicou a canção à mãe. “Ela foi o grande ponto de partida para que eu começasse a entender muitas coisas sobre a minha família. No passado, nossa relação foi bastante complexa, mas, com o tempo, compreendi a força e a coragem que marcaram sua jornada de transformação. Por isso, essa música é dedicada a ela e a todas as mulheres da minha ancestralidade, que de alguma forma pavimentaram o caminho para que hoje eu possa me expressar livremente, reconhecendo em mim e nas mulheres à minha volta, potência e independência”, revela.
Neste momento em que percorre o seu próprio caminho, Femark deseja que sua música possa impactar as próximas gerações em termos de visibilidade e aceitação de diferentes expressões do feminino. A artista afirma que gostaria de que “Passarinha” pudesse ir além da canção, propriamente. A partir do conhecimento sobre estudos publicados pela União Brasileira de Compositores (UBC), em 2024, nasceu seu desejo de dar visibilidade a mulheres de diferentes idades e potências, em um projeto que fosse 100% feminino.
Além das compositoras Bela, Emma, Concê, Gaê e Gabi Terreiro, o projeto também conta com a produção e direção musical de Raíssa Spada, instrumentação de Marina Bastos (flauta), Viviane Pinheiro (piano) e Bela (violão), Direção, filmagem e fotografia de Jöa Azevedo, edição e montagem de Rafa Lima (que assina o roteiro com Jöa e Femark) e design de Isabela Alckmin.
A UBC é uma das principais associações responsáveis pela gestão e repasse da receita de direitos autorais a artistas, acumulada em meios como rádio, TV, shows, digital, entre outros. E, de acordo com o estudo, mulheres receberam apenas 10% de receita de direitos autorais distribuída em 2024, ou seja 90% dela foi direcionada a homens. Influenciando este dado, está o fato de apenas 17% das pessoas cadastradas na base da UBC serem mulheres. Dentre os 100 associados com maior rendimento por direitos autorais, apenas 13 são mulheres. A primeira mulher a ser mencionada na lista figura na 21ª posição.
Segundo dados do IBGE (2022) 42,1% das mulheres brasileiras residem no Sudeste, enquanto 27,2% vivem no Nordeste. Contudo, a região Sudeste do Brasil concentra 61% das artistas cadastradas na UBC, enquanto apenas 16% são nordestinas.
Esses dados evidenciam a persistente desigualdade de gênero nas indústrias musical e audiovisual. Ao promover a participação feminina em todas as etapas da produção musical e valorizando artistas de diferentes estados brasileiros, Femark não só age contra o machismo nessas áreas, mas também serve como referência para outras mulheres, incentivando-as a perseguirem carreiras na música e no audiovisual.
“A visibilidade de mulheres em todas as funções do processo criativo e produtivo é essencial para inspirar e motivar novas gerações a romperem barreiras e seguirem seus talentos e paixões. Estou muito interessada em apresentar esse tipo de projeto em escolas, em workshops. A gente precisa que esse exemplo venha de algum lugar. Então eu gostaria muito que este fosse um dos projetos que mulheres possam olhar e pensar: ‘Nossa, só minas fizeram tudo isso. Então eu posso ser uma produtora musical, uma instrumentista, sonhar e conquistar o meu espaço”, finaliza Femark.
Força e sensibilidade na construção de uma nova narrativa feminina
Nessas sessões, Femark desenvolveu uma dinâmica para investigar a árvore genealógica de cada uma das parceiras musicais e audiovisuais. O objetivo era refletir sobre o que cada uma carrega dessas mulheres que vieram antes, o que elas gostariam de continuar passando para as próximas gerações ou para outras mulheres que estão por perto e, sobretudo, o que elas gostariam de encerrar nesta geração em que vivem. “Percebi que muitas de nós éramos as primeiras nas nossas linhagens a morar e viajar sozinhas, a ter o privilégio de nos auto conhecermos, a conseguir nos livrar de relações abusivas com mais facilidade, e assim por diante, iniciando ciclos virtuosos em nossa geração.”
Ao romper com quaisquer estereótipos, Femark quer mostrar que força e feminilidade não são opostas, mas complementares. Sua abordagem evidencia que a potência de uma mensagem não depende de características tradicionalmente masculinas para ser impactante, reafirmando que a autenticidade pode ser, ao mesmo tempo, firme e sensível.
Em algum grau, “Passarinha” é sobre legado. E para Femark, a coragem diante das adversidades que suas antepassadas enfrentaram é o maior deles. Esse movimento de liberdade, presente nas mulheres de sua família, tem sido fundamental para que ela construa sua própria história e também inspire as futuras gerações. A artista espera que suas atitudes e escolhas também sirvam de exemplo para suas filhas e netas, caso um dia as tenha, ou outras mulheres perto de si, perpetuando essa força feminina.
Todo o processo de composição foi capturado em câmera de cinema e transformado em um documentário, com estreia programada para a semana do dia 4 de maio.